Custa-me deixar-te (1/3)

É difícil deixar-te. Amigo.

É difícil deixar as pessoas com quem convivo. É difícil ano após ano deixar os meus amigos e ter que me habituar a novas pessoas e mostrar-lhes quem eu sou outra e outra vez. É isto que nos muda e nos destrói.

Está mudança, constante, é algo transversal a países, raças ou religiões. É, na minha singela opinião, um problema profundo da nossa sociedade. E quando digo nossa, digo toda a sociedade e todas as sociedades.

Desde que nasci que fui habituado a deixar pessoas para trás. A perder o mais ínfimo contacto. A perder grandes amigos. A guardar pessoas no baú das recordações como se as relações pudessem ser esquecidas. Na escola, na equipa, na música, em tudo. Tudo na minha vida consiste em abandonar. E o grande problema é que fui educado para isto. Nada disto é uma surpresa, nada disto é inovador. Revolta-me.

Lembro-me disto porque amanhã começa o 3º período e, no silêncio imóvel da escuridão, pensei como seria quando o ano acabasse. E vai ser difícil. Por mais inimizades e antipáticas que tenha na minha turma, estas são as pessoas com quem convivi durante três anos num espaço com 40 m2. Tenho aqui amigos como nunca tive, tenho aqui a minha primeira namorada, tenho aqui as pessoas mais cômicas que já conheci, as pessoas mais simpáticas, mais giras, mais descontraídas, mais divertidas. As pessoas que fizeram o meu dia a dia durante três dias.

E agora à sempre aquele parvo que se levanta a meio da discussão e diz “apenas depende de ti manter o contacto com essas pessoas”. Não é assim. Elas não vão fazer o meu dia a dia, vão acabar as “brincadeiras”, vai acabar a essência deste aglomerado de diferentes. E chamo-lhe diferentes por não serem indiferentes. Porque eles se sentem como eu, porque toda a gente se sente como eu. Não há uma única pessoa que faça algo para o mudar. Sinceramente nem eu seria capaz, não encontro nos meus pensamentos uma solução para o problema, mas talvez a haja. Apenas precisa de ser encontrada. Tal como eu encontro amigos no baú das minhas recordações.

Leave a comment